São João da Cruz nasceu no Século de Ouro espanhol, em meio a pobreza, beirando à miséria, em Fontiveros, próximo a Ávila, em 1542. Teve por pais Gonzalo de Yepes e Catalina Álvarez. Ficou órfão quando tinha aproximadamente cinco anos. Seu irmão caçula morreu na infância, muito provavelmente de desnutrição. Viúva, sua mãe tornou-se migrante com os dois filhos pequenos: João e Francisco. Em 1548 estava morando em Arévalo, e, três anos depois, em Medina del Campo, onde se estabelceu como tecelã.
Com nove anos, João foi acolhido numa espécie de orfanato para crianças pobres e ali recebeu os primeiros estudos e meios para sobreviver (Colégio de Doutrina). Precisou trabalhar desde cedo para ajudar no sustento do lar. Teve, portanto, uma infância pobre, difícil e marcada por privações de todo o tipo.
A realidade dura e sofrida poderia tê-lo deixado revoltado… Mas, ao contrário, João de Yepes – este era seu nome de batismo – deixou-se moldar pela experiência da pobreza. Experimentou concretamente a ausência de tudo o que o coração humano deseja (bens, afetos, consolações) e nessa carência encontrou Deus, ou melhor, foi encontrado por Ele.
Com 21 anos, isto é, em 1563, fez-se frade carmelita. Ali passou a chamar-se frei João de São Matias. Mais tarde, querendo radicalizar o seguimento de Jesus Cristo e pensando ir para a Cartuxa, foi convencido por Santa Teresa a entrar para a Reforma que ela havia iniciado com as monjas. Assim, em 1568, tornou-se o primeiro frade Carmelita contemplativo, conforme a terminologia da época
A história nos ensina que radicalidade incomoda os menos exigentes. Os Frades Calçados tomaram medidas para impedir a expansão da Descalcez. Em meio aos conflitos, frei João da Cruz foi um dos que mais sofreu. Ficou preso por nove meses. Numa cela suja, sem luz nem diálogo, respirando o mesmo ar da latrina e vestindo a mesma roupa, teve a maior experiência do nada, que o acompanhou a vida inteira. Diante da dor, do sofrimento e das privações de toda espécie, foi consolado pela graça divina numa profunda experiência religiosa. Em meio à escuridão, ao isolamento, ao abandono por parte de seus irmãos, à privação da Eucaristia, aos maus-tratos, ele confirma suas convicções evangélicas para saborear Deus em sua total pureza, sem misturá-lo aos consolos terrenos. Foi na prisão que compôs grande parte de seus poemas, que mais tarde comentaria
Depois de fugir do cárcere, em 1577, assumiu cargos no governo da Reforma, até o momento em que, num Capítulo da Ordem, teve que opor-se aos caminhos que seus irmãos de hábito queriam tomar, caminhos contrários às inspirações de Teresa, já falecida. Por causa de suas opções, foi colocado à margem da incipiente Refoma; quiseram até mesmo expulsá-lo da Ordem. No fim de sua vida, já doente, foi-lhe dada a oportunidade de escolher onde queria morar. Preferiu ir a um convento cujo superior o via com desprezo. Oprimido pelas dores físicas e morais, faleceu em 14 de dezembro de 1591, aos 49 anos de idade.
São João da Cruz foi canonizado em 1726. Duzentos anos depois, 1926, o Papa Pio XI o declarou Doutor da Igreja.